Mineiro da cidade de Piau, distante 281 quilômetros de Belo Horizonte, o jovem técnico Léo Condé, de 42 anos, retornou em março ao Sampaio Corrêa, cinco anos após a sua primeira passagem pelo clube. E ao assumir o time, a diretoria lhe deu duas missões. A primeira já foi alcançada, com o título do Campeonato Maranhense (e a vaga na Copa do Brasil e na fase de grupos da Copa do Nordeste). A segunda está perto de também ser conquistada. A de evitar uma nova queda da Bolívia para a Série C.
E mesmo com 31 pontos, com o time muito mais próximo da grupo de acesso à Série A do que da zona de rebaixamento, o discurso no clube não mudou. Pelo menos é o que garantiu o treinador, em entrevista exclusiva ao NE45. Por telefone, Léo Condé recordou o início complicado na Série B, com apenas um ponto conquistado nos seus cinco primeiro jogos, analisou o atual cenário da competição e o futebol em tempos de pandemia. Falou também da carreira e de como enxerga o atual mercado do futebol no Nordeste. Confira abaixo, os principais pontos da entrevista.
Com o início conturbado na Série B, você temeu ser demitido?
Fui contratado muito pelo trabalho que eu fiz aqui em 2015, quando o Sampaio brigou pelo acesso até as rodadas finais (terminou a Série B na oitava posição). Então a gente passou por um processo de reformulação muito grande dentro do plantel. Do elenco que jogou o estadual para o que iria disputar a Série B. Mas logo que iríamos iniciar esse processo veio a pandemia e isso foi interrompido. Quando retornamos aos treinamentos, em julho, ainda estávamos na remontagem do elenco, com jogadores chegando e outros sendo liberados. No começo da Série B chegando a fazer dois bons jogos contra Vitória e Juventude (derrotas por 1 a 0) ainda dentro desse processo. E depois veio aquela avalanche de casos do coronavírus no elenco (o clube chegou a ter 14 atletas infectado) e ai já fizemos dois jogos bastantes desfalcados contra Chapecoense e Ponte Preta. Realmente foi bastante tenso. Mas em momento algum por parte da direção houve questionamento do trabalho. Nós sempre tivemos tranquilidade para fazer o processo que imaginávamos que era o correto, fomos ajustando peças e encaixando o trabalho.
E quando você foi contratado, quais eram as metas do Sampaio. O trabalho foi visando o acesso à Série A ou era mais modesto, de pés no chão?
Sem dúvida, a ideia quando fui contratado era conseguir duas metas. O primeiro era conquistar o título estadual para que o Sampaio conseguisse as vagas diretas para a Copa do Brasil e a Copa do Nordeste, além de que faziam dois anos que o clube não conquistava o título. E a outra meta era a permanência na Série B. O Sampaio subiu para a B em 2013 e se manteve em 2014 e 15. Depois caiu em 16 e voltou em 17, caiu em 18 e voltou em 19. Por isso, a ideia ainda continua sendo essa de permanência. Pela nossa matemática, ainda precisamos somar mais 14 pontos para chegar aos 45 , pontuação que nenhum clube nunca caiu. Naturalmente, se conseguirmos essa pontuação com certa antecedência, vamos brigar e buscar sim o acesso. Mas nós temos os pés no chão. O nosso orçamento é muito baixo. Talvez o mais baixo da Série B (a folha salarial do elenco gira entre R$ 380 e 400 mil, segundo apurou a reportagem). Mas o clube vem conseguindo cumprir suas obrigações. Montamos um elenco com muitos jogadores que nunca jogaram a Série B. Nesse momento estamos em situação interessante na tabela, mas ainda faltam 19 rodadas. Tem muito água pra passar por debaixo da ponte. Estamos muito pés no chão e focados em conseguir os 45 pontos. E temos a consciência de que temos muito a evoluir para, de fato, disputar um acesso.
Como você está vendo essa Série B? Quais clubes enxerga como o favoritos ao acesso?
Eu vejo duas situações mais definidas. A Chapecoense com um cenário bem encaminhado para o acesso e o Oeste em uma situação bem complicada. Não é impossível, mas é muito difícil. Com relação ao restante, claro que o América e o Cuiabá possuem pontuação interessante, mas Juventude, Sampaio e a Ponte estão encostando. Acho que está totalmente em aberto. E a prova maior é justamente o nosso caso, que em cinco rodadas tínhamos um ponto. E depois de 14 rodadas estamos próximos do G4. Naturalmente pela pontuação e consistência de jogo, vejo o América, Cuiabá e Chape como candidatos maiores ao acesso, mas não dá para cravar. O CSA vem crescendo muito nas últimas rodadas e você nunca pode descartar um Cruzeiro. Talvez só as duas extremidades se mostrem mais consolidadas. O restante muita coisa pode acontecer.
Os jogos adiados (vitória sobre o Figueirense e empate com o Brasil por conta dos casos de Covid-19 no elenco e contra o Náutico pelas finais do Campeonato Maranhense, marcado para o dia 17) ajudaram o Sampaio? Uma vez que originalmente seriam disputados em um momento de maior dificuldade do clube?
Não vou ficar em cima do muro. De uma certa forma, a gente encaixou o time, enfrentamos essas equipes agora e conseguimos bons resultados. Não significa, porém, que a gente não poderia vencer o Figueirense e empatar com o Brasil fora (nas datas originais). Esse jogos foram adiados porque tínhamos apenas 11 jogadores à disposição e não tínhamos condições de atuar. Em outros casos a CBF não aceitou adiar. Na Série C, o São Bento chegou a utilizar um goleiro na linha. Acho que o correto foi o que aconteceu com o Sampaio. É um absurdo uma equipe com apenas 13 jogadores ser obrigadas a jogar. Nós fomos para o jogo contra o CRB (pela 7ª rodada) sem goleiro no banco.
Ainda com relação à Covid-19. Como está sendo jogar em estádios sem públicos?
Acho que isso mais atrapalha do que ajuda, porque fica com cara de amistoso. Mobilizar os atletas é um desafio que a gente tem a mais. Claro que eles são profissionais, mas também são seres humanos que jogaram com torcida a vida inteira. Não ter a atmosfera da torcida atrapalha. Mas por outro lado, como o torcedor de maneira geral é impaciente, também tem o lado que, para sobrepor um momento de instabilidade, é melhor. Vencemos o jogo contra o América em casa, após quatro derrotas, depois de um primeiro tempo empatado por 0 a 0. Talvez se tivéssemos com torcida não teríamos a tranquilidade que tivemos para vencer a partida. E também tem a questão financeira. Está sendo uma luta tocar o futebol. Perdemos patrocínio, sócio torcedor e ainda não tem bilheteria. O que para os clubes do Nordeste conta muito. Mas os salários no Sampaio estão em dia.
Você é um treinador jovem, de 42 anos, como projeta a sua carreira para o futuro? Dentro da alta rotatividade de treinadores no Brasil é possível fazer esse planejamento?
Com toda sinceridade, no futebol brasileiro é quase impossível fazer isso. É meio que uma loteria. Mas é claro que os trabalhos que vamos realizando vão cravando nosso nome no mercado. A minha ideia era trabalhar até os 35 anos na base. Mas em 2009, com 31 anos, fui demitido da base do Atlético-MG, e recebi o convite para assumir o profissional do Tupi, onde fiquei três anos. Em 2015 fui vice-campeão mineiro com a Caldense, que foi o que despertou o interesse do Sampaio Corrêa na minha primeira passagem e isso abriu novos horizontes pra mim. E nos quatro, cinco anos seguintes colecionei bons resultados e alguns não tão bons. Consegui o acesso com o Botafogo-SP da Série C para a B em 2018, o título estadual com o CRB. Você vai plantando e o mercado vai acompanhando. Claro que eu tenho um sonho de buscar uma Série A. Mas foco muito onde eu estou. O importante é eu estar feliz aqui e fazer um bom trabalho para quem sabe dar um passo maior mais à frente.
Você recebeu alguma proposta ou sondagem de outro clube recententemente, por conta da boa campanha do Sampaio na Série B?
Com toda sinceridade não recebi nada. Nem proposta, nem sondagem. Estou totalmente focado no trabalho no Sampaio. A ideia é terminar o trabalho aqui. Faltam três meses e o trabalho está fluindo de uma forma bem saudável.
Falando em mercado, como vê o cenário do futebol do Nordeste? Hoje é mais atrativo e consolidado do que em anos anteriores para treinadores e jogadores?
O futebol do Nordeste está se organizando muito. Antes se preocupavam muito em só contratar jogador e não com a estrutura. Hoje a maioria dos clubes nordestinos das principais capitais têm essa preocupação e têm evoluído muito. Sem dúvida para quem trabalha com futebol, o Nordeste é um mercado interessantíssimo. Hoje a maioria dos clubes pagam em dia e isso vai consolidando. Hoje a estrutura do Sampaio é funcional, já que é uma luta muito grande para se fazer futebol aqui. Mas de cinco anos pra cá vi uma evolução grande. Recentemente construíram um segundo campo para treinamento e a gente vê essa preocupação do clube. Porém, ainda tem que melhorar bastante se comparado a outros clubes.
Fotos: Lucas Almeida/Sampaio Corrêa
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