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João de Andrade NetoNáuticoPESérie B

Nílson merece um novo pedido de desculpas

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No dia 18 de setembro, o Náutico chamou a atenção do Brasil com uma atitude corajosa e digna de aplausos. No embalo do movimento “Vidas Negras Importam”, lançou um vídeo institucional onde reconheceu seu passado racista com um texto narrado pelo ex-goleiro Nílson, negro e ídolo do clube. E que sentiu o racismo vindo das arquibancadas dos Aflitos, ao ouvir gritos que imitavam sons de macacos. O vídeo terminava com o lançamento da camisa preta, utilizada de forma histórica pelo time no primeiro tempo do jogo contra a Chapecoense. Porém, quase dois meses depois, é hora de voltar a pedir desculpas a Nilson e a todos os negros. Que mais uma vez foram usados. Dessa vez para vender camisas.

Nesta quinta-feira, o conselho deliberativo do clube publicou uma postagem em suas redes sociais enfatizando que estatutariamente o Náutico é vermelho e branco. Do nada. Como se alguém precisasse se lembrar disso. A publicação serviu apenas como uma resposta à campanha lançada meses atrás, e que dizia que o Náutico “também era preto”. Se esquecendo que o clube já vestiu o verde e o vinho em uniformes alternativos. Mas ao que parece, o problema foi só com uma cor.

Após enxurrada de críticas, a postagem foi apagada. Porém foi o suficiente para escancarar o quanto o clube, representado pelo seu maior poder, ainda não evoluiu para reconhecer os seus próprios erros, que a campanha de marketing (hoje oca, vazia e sem sentido) alardeava.

Tive acesso à parte da ata da reunião do mês de outubro do conselho deliberativo. Nela, o vice-presidente de marketing Luiz Felipe Figueiredo solicita a utilização do uniforme preto mais uma vez pelo time no jogo do contra o CRB, marcado para 21 de novembro (dia seguinte ao da Consciência Negra). Alerta que a ideia não é oficializar a camisa como terceiro padrão, diz estar preocupado com a continuidade das ações contra o racismo e até chega a citar a “monetização da campanha”, lembrando as boas vendas das camisas. Ainda assim é rebatido.

Um dos conselheiros, o ex-presidente do executivo Márcio Borba, se posiciona como principal crítico à campanha lançada pelo clube ao dizer que o Náutico “jamais foi racista” e que o movimento Vidas Negras Importam é “político”. E completa afirmando que a ação foi “um dos maiores absurdos que já viu na vida”, “uma irresponsabilidade” e que jogou “na lama o nome do clube”.

Segundo a ata da reunião, para Borba, o Náutico “se autoproclamou racista e pediu desculpas por um crime que não cometeu, em troca de likes nas redes sociais ou cinco minutos no Bem Amigos (programa do Sportv)”. E completou dizendo que o “uniforme preto é antiestatutário” e perguntando “qual o presidente do clube descriminou negros?” O posicionamento é apoiado por outros conselheiros.

Em contato por telefone, Márcio Borba confirmou tudo o que está escrito na ata do conselho e voltou a criticar a campanha lançada pelo clube. “Reafirmo tudo o que disse e que consta na ata”, iniciou. “Não existe nenhum estatuto, regimento ou norma de piscina, em qualquer época, que o Náutico tenha imposto alguma norma racista. É importante separar a personalidade jurídica da instituição do CPF dos seus sócios. O Clube Náutico Capibaribe, como instituição, nunca foi racista”, reafirmou Borba que também se voltou a se colocar contra o uso do uniforme preto.

“Criem o que quiserem, o estatuto determina que o terceiro padrão pode ser diferente, porém com as cores vermelha e branca. Esta camisa preta não é nossa cor, nem tem motivo para ser. E o escudo também não obedeceu as nossas cores. Eu não discordo do mérito do ‘Vidas Negras importam’ mas discordo de que se use temas políticos para aparelhar o clube. Eu considero a campanha ‘Vidas Negras Importam meritória. Também sou contra o racismo por ser cristão, mas o que também sou contra é usar o Náutico como massa de manobra para defender teses políticas, que são proibidas pelo estatuto”, encerrou.

A postagem com o vídeo do lançamento da camisa preta do Náutico, já visualizado por quase 2 milhões de pessoas segue fixado no perfil oficial do clube no Twitter.

Foto: Comunicação/CNC

5 Comentários

5 Comments

  1. Thiago Souza

    12 de novembro de 2020 a 20:16

    Não precisa nem perguntar em quem esse cidadão votou, né?

  2. Ítalo Gusmão

    12 de novembro de 2020 a 22:55

    “Também sou contra o racismo por ser cristão…” deveria ser contra o racismo por ser humano.

  3. Francisco Sá Barreto

    12 de novembro de 2020 a 23:01

    Mais do que um excelente texto. Um texto necessário. Ilha de lucidez e qualidade na crônica esportiva. Parabéns à equipe. Parabéns a João. Vergonha da velharia colonial que administra o futebol en Pernambuco (só o futebol?).

  4. José Beltrão

    14 de novembro de 2020 a 11:37

    Sou rubro negro e ficava puto, chegando até a bater boca com outros torcedores, quando faziam aqueles sons de macaco contra Nilson, na época no santa cruz. Quando o náutico lançou a campanha voltei no tempo e vi que estava certo em me revoltar com a galera. Parece que estou vendo os conselheiros do náutico debatendo o assunto, deve ter sido um show de horrores.

  5. Gustavo Angelo

    16 de novembro de 2020 a 16:07

    O mais triste é que indivíduos que partilham do visões de mundo como esse estão representados aos montes nas direções dos clubes de futebol do Brasil. O que de algum modo nos explica o por quê de nosso futebol ser tão arcaico dentro e fora de campo.

    Lamentável.

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