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Fred FigueiroaPESérie ASport

O Teatro dos Vampiros

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A reunião extraordinária do Conselho Deliberativo do Sport – que aconteceu nesta segunda-feira – foi, em sua essência, um teatro. Ou um “Teatro dos Vampiros”, citando Renato Russo. Havia um roteiro pronto estabelecido – escrito pelas mesmas mãos de sempre. A verdade, fria e frustrante, é que um simples requerimento assinado por um punhado de ex-presidentes é mais que suficiente para ditar os rumos do processo democrático de um clube com dezenas de milhares de sócios. Milhões de torcedores. Isso é, realmente, o que fica deste capítulo constrangido e constrangedor da história.

E, pior, este é um capítulo que poderia ter sido evitado. As mudanças no calendário deveriam ter movido as lideranças do clube a reorganizar o processo eleitoral meses atrás. Antes mesmo da estreia na Série A. Particularmente sempre me pareceu algo extremamente perigoso a eleição no começo do 2º turno do Brasileiro – justamente por conhecer o barril de pólvora que é a política do Sport. O que eu temia, meses atrás, é exatamente o que aconteceu agora. O requerimento, os muitos áudios vazados de dirigentes do clube, os ataques de lado a lado, o envolvimento de atletas, os torcedores transformados em militantes, a falta de articulação política da situação para lançar uma chapa e a própria reunião extraordinária são parte de um corrosivo processo que deveria ter sido previamente neutralizado. Tudo o que aconteceu nos últimos dias, nas últimas semanas, já é a pior parte deste processo. O caminho escolhido foi o pior possível. O mais enlameado. Havia tempo para ser algo construído próximo do consensual e com maior chance de aceitação da torcida. Mas outros interesses sempre pesam.

O que se viu foi uma sequência de mudanças de visões por parte da atual gestão a partir das oscilações – bem naturais – de desempenho do time na Série A. Quando o Sport passou a habitar uma faixa mais segura da classificação, veio um movimento de tentativa de antecipação da eleição para novembro. Quando a equipe caiu de rendimento e mergulhou na sua pior sequência no campeonato, um intenso trabalho de bastidores conseguiu empurrar a votação para março do ano que vem. Tudo a partir do entendimento de que a permanência ou não na Série A é o principal peso na balança eleitoral. Um all in político, ético, moral e esportivo que deixa o Sport flutuando em um mar de incertezas. Afinal não haverá qualquer intervalo entre as temporadas. A 1ª fase da Copa do Brasil – competição fundamental para a estabilidade financeira e que o Leão não conseguiu se classificar em 2019 e 2020 – já será no dia 10 de março. Um eventual rebaixamento tende a trazer uma avalanche de danos irreparáveis a curtíssimo prazo.

A estabilidade do elenco para a reta final da Série A foi ponto fundamental da argumentação feita por Wanderson Lacerda na reunião do conselho. Então o mínimo que se deve cobrar agora de quem gere o clube é criar um escudo de proteção para essa estabilidade. E não agir de forma oposta, alimentando a instabilidade com questionamentos sobre o trabalho do técnico Jair Ventura, que tem o apoio do elenco. Ou muito menos fazendo negociação com grupos organizados com amplo histórico de violência para cobrar os jogadores pessoalmente em caso de uma derrota na próxima partida. Ou seja, a defesa da “estabilidade do elenco” não pode ser um mero um discurso para encobrir uma manobra política que ficou escancarada nos áudios vazados de conversas no Whatsapp. O que, inclusive, mostra a fratura interna do clube.

A gestão de Milton Bivar nesses últimos dois anos não foi perfeita – e dificilmente alguma conseguiria ser tamanho o colapso herdado – mas recolocou o clube minimamente no eixo. Foi uma gestão digna. Simples e eficiente em vários segmentos. Disputar a permanência na Série A neste momento, depois de 23 rodadas, está muito longe de ser um demérito. Este sempre foi o objetivo. E, ao que parece, mesmo internamente, existem vice-presidentes ou diretores que não fazem essa avaliação e acabam tornando o ambiente ainda mais instável. Insustentável. São os mesmos que estão na linha de frente conspirando, tramando, defendendo e celebrando o adiamento das eleições – sem conseguir, por um instante sequer, convencer de que o motivo apresentado é realmente verdadeiro.

Sem uma chapa da situação disputando a eleição em dezembro, os que fazem o Sport hoje sairiam de cabeça erguida pelo trabalho neste biênio. Do presidente aos diretores. Talvez alguns pudessem até seguir no clube dependendo do resultado eleitoral. Diferente de 2018, não há terra arrasada ou (pelo menos não havia) sentimento de caça às bruxas. Afinal os extremismos existem, mas não alcançam todos. De dentro e de fora. Mas depois desses últimos capítulos e manobras, a escolha foi pelo tudo ou nada. Esportivo, ético e moral. Acabou o meio termo.



1 Comment

1 Comment

  1. Adolfo Cezaris

    30 de novembro de 2020 at 15:46

    Ótimo texto, Fire. Infelizmente 2021 já vai sendo prejudicado, independente se vamos estar na A ou na Boca.

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